quarta-feira, 7 de janeiro de 2015


(...)
– Gostas da minha coninha?
– Não se diz isso. É feio.
– E a coninha: achas a minha coninha feia?
– Já vi coninhas melhores, se queres que te diga. Mas não é uma coninha feia.
– Parvo.
– Já vi coninhas vaidosas, alegres, simpáticas, arrogantes, cerebrais, intuitivas, cordiais, virtuosas, prazenteiras, românticas, bondosas, medonhas, infantis, ciumentas, vulgares, incompreendidas, entusiastas. A tua coninha só tem pouca personalidade. Não é grave.
– O que queres dizer com isso? Olha para ela com atenção.
– Estou a olhar.
– Achas que lhe falta assim tanta personalidade? Olha bem.
– Acho.
– O que queres dizer com isso?
– Personalidade. Atitude. É uma coninha passiva. Parece-me lenta. Nunca ouviste a história da coninha adormecida? Não sei se me entendes. É uma coninha mandriona, é o que é.
– Uma coninha mandriona?
– Não te rias. Não é motivo para risos.
– Não me estou a rir.
– Então é ela. Olha para ela. Ri-se de quê, esta puta interesseirona?
– Ri-se de ti e da tua pichota ridícula.
– Qual é o mal da minha pichota? É uma pichota elegante, dir-se-ia até distinta, helénica, vigorosa, apessoada, tranquila, apolínea, marmórea e culta.
– É uma pichota pequena, meu amor. Sempre disse que era muito pequena, parece meio atarracada. O teu pai é asiático?
– Não.
– A tua mãe?
– Não.
– A tua pichota?
– Já lá esteve e não gostou.
(...)


João Pereira Coutinho «As palavras propriamente ditas» in Revista 365


3 comentários:

  1. Ah ah ah ah...era uma vez a bela da coninha que estava adormecida...
    As histórias deviam começar assim... :P

    Beijo no seu rosto fofo, Miss 31 :)

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