quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

Vidas #1


Elisabete, todos os Natais, arruma as trouxas dos pequenos e do marido e ruma com eles para Portalegre. Entre a casa da mãe e a casa da sogra, depois a dos tios e tias, que há um ano não se viam, os primos, que estão cada vez mais crescidos e graúdos, quase não há tempo para pensar em si. Fica-lhe um vazio que não entende, logo ela que tem tudo, saúde, um marido que a ajuda, dois filhos maravilhosos. 
Na altura das festas, dormindo todas as noites em camas diferentes, colchões que não lhe conhecem as formas generosas, que a todo custo tenta disfarçar, sente-se ainda mais sozinha. Uma vergonha invisível, catequese da mãe, impede-a de procurar o corpo que dorme ao seu lado. Tão pouco aquele corpo a continua a procurar. Escondida, de porta trancada, ousa, em algumas manhas de domingo, procurar um orgasmo que lhe liberte a raiva silenciosa. Mas ou é o João que bate à porta, ou os miúdos que gritam no quarto, guerrilhando por tudo e por nada, ou a mãe que telefona mais uma vez para saber da vida e se está tudo bem, e na maior parte das vezes nada mais consegue do que chorar um pouco.
Teve um namorado, antes do João, mas nunca passaram do sexo oral e da penetração com os dedos. Mas, mesmo sem que lhe tivesse sentido o sexo, os orgasmos eram constantes e intensos. A única coisa a que se lhe negara, tinha sido a engolir-lhe o sémen, coisa que ele ainda insistira duas ou três vezes, dizendo que era uma prova de amor. Vontade de experimentar, não lhe faltara, mas era nova, ingénua, e acreditava piamente que, se o fizesse, podia engravidar. Hoje ria de tamanha palermice, mas há quinze anos, pouco sabia da vida.
Negou a primeira vez ao Quim, porque queria casar virgem e tinha um medo terrível de engravidar. Seria amaldiçoada pela mãe e expulsa de casa pelo pai. Ardia em desejos e quando o Quim lhe mostrava os preservativos, quase se deixava ir até ao fim, permitindo que ele lhe roçasse o sexo duro nas virilhas e no clitóris. Mas as sombras dos pais, o cinto que tão bem conhecia, impediam-na sempre de se entregar totalmente. A pedir desculpas, entre algum choro e sorvedouro, afastava-se dele e tentava acalmar-se. Ele era gentil, não insistia mais e, suavemente, introduzia-lhe um dedo na vagina molhada e intumescida, depois outro e finalmente um terceiro.


[cont.]